MARACATU ESTRELA DE OURO

Explore os ritmos pulsantes do Maracatu Estrela de Ouro, um grupo histórico de Pernambuco. Descubra a história do Maracatu, sua significância cultural e como o Estrela de Ouro defende as tradições afro-brasileiras através de desfiles vibrantes e engajamento comunitário.

ROTEIRO – 9 – MARACATU ESTRELA DE OURO

JOSI MARINHO – este é o Podcast Nossa História, Nossa Memória, realizado com o incentivo do Funcultura,  Fundarpe, Secretaria de Cultura e Governo do Estado de Pernambuco.

JOSI MARINHO – Se tem algo que a gente aprendeu ao longo de nossos episódios é que a tradição cultural passa de geração em geração… São filhos que deram continuidade a paixão dos pais… São netos que aprenderam uma brincadeira com os avós e agora levam muito a sério algo chamado de cultura popular. 

TRILHA

JOSI MARINHO – No episódio de hoje, mais uma vez, uma família estará no centro da história. É a família e o legado do Mestre Batista. Ele transformou o sitiozinho do pai, na sede de um maracatu. Seu Batista faleceu em 1991, mas o filho dele, José Lourenço da Silva,  assumiu a missão do pai e deu continuidade a esse legado. Esta história vem do terreiro fértil do sítio Chã de Camará, que fica no município de Aliança,  na zona da mata norte do estado de Pernambuco, a 90 quilômetros do Recife. 

JOSI MARINHO – Eu sou a jornalista Josi Marinho. Mulher negra, produtora cultural e realizadora desse projeto. Eu te convido para conhecer essa história com a gente. 

DESC – E eu sou Cris Xavier, mulher negra e produtora cultural. Você já sabe que este podcast conta com recursos de audiodescrição. Ele é importante para contar histórias para pessoas com deficiência. Esse som … (pausa) … Indica que você vai ouvir minha voz descrevendo algo importante do nosso episódio. 

JOSI MARINHO – era 1965 e Severino Lourenço da Silva,  mais conhecido como Mestre Batista, começa a se organizar para criar o Maracatu Estrela de Ouro. Ele contou com o apoio de outros moradores que queriam inserir o maracatu nas brincadeiras populares que já existiam por Aliança,  como cavalo marinho, ciranda… O Estrela de Ouro de Aliança só foi criado mesmo depois do romper do ano. Foi em primeiro de janeiro de 1966 que o grupo foi oficialmente criado. Em 2024 ele completou 58 anos de fundação. Vários mestres foram formados no terreiro do Estrela de Ouro, como Manoel Salustiano, Luiz Paixão, Biu Roque e Zé Duda. Verdadeiros patrimônios culturais de nossa gente Mestre Batista era um homem de riso fácil e muito bem humorado, mas também exigente. Ele cuidava de cada detalhe do maracatu rural. Juntava os caboclos, verificava se arrumações e guiadas estavam prontas, se os enfeites, as golas, os chapéus, os surrões estavam perfeitos… Participava de cada processo. Em 1991, Mestre Batista morreu. O filho, conhecido como Zé Lourenço, não quis de cara assumir o trabalho do pai. Mas depois que viu o legado quase acabar resolveu tocar o sonho do Mestre Batista… Ele mesmo vai contar essa história. Nossa conversa hoje é sobre as memórias de José Lourenço da Silva, presidente do maracatu Estrela de Ouro de Aliança. 

DESC – José Lourenço da Silva é um homem de 69 anos, usa óculos,  é grisalho e com poucos cabelos. Ele está sentado numa sala cheia de estandartes do Maracatu Estrela de Ouro, além de vários troféus. É um lugar muito colorido e lembra o carnaval. A nossa conversa acontece na sede do Estrela de Ouro. É um casarão no meio de um sítio cercado por muitas árvores. A casa é rodeada por uma grande varanda e pintada de amarelo. As portas e janelas são contornadas de verde. No dia da nossa conversa o tempo estava nublado, chove em alguns momentos e venta bastante. Algumas vezes será possível ouvir o som da chuva. 

JOSI MARINHO – Mestre, seja bem-vindo a essa conversa. Estamos num território tão rico, num espaço tão lindo que é essa propriedade rural… Como é fazer parte de tudo isso? 

00’31’’ – É uma história bem inusitada, porque é uma história que vem de muitos anos, do meu pai. Eu apenas dei continuidade a essa história do Maracatu Estrela de Ouro, acompanhando a movimentação e as mudanças do tempo. E hoje estamos aí. O Maracatu foi campeão várias vezes. Na nossa gestão também foi campeão, vice-campeão do grupo especial. Às vezes sai do grupo especial fica no grupo 1, volta para o especial… é assim. 

JOSI MARINHO – Mestre Zé Lourenço conhece bem as origens do maracatu. A gente pisa hoje numa terra que no passado foi pisada por negros, indígenas, escravizados. Todos sofreram influência portuguesa. Os costumes moldaram a tradição do maracatu rural. 

1’54’’ – Olha, é o seguinte, a história do Maracatu Rural chegou aqui através do negro, do índio e dos trabalhadores dos Engenhos. O Maracatu Rural ele é uma brincadeira. Ele é afro-indígena, uma mistura dos dois. Ele surgiu mais a partir da metade do século XIX. É mais recente. O maracatu de baque virado – maracatu nação – ele tem uma certa origem da África, dos portugueses também com a questão dos negros… das senzalas… eles brincavam. São mais antigos. Mas o rural não. Tem a história também das cambindas. O Maracatu, ele se gerou a partir das cambindas. 

JOSI MARINHO – E o que são as cambindas?

03’04’’ – As cambindas são uma brincadeira, bem diferente. Os negros, homens pescando alguns vestidos de roupa de mulher. Uma coisa assim. Hoje, disse que tinham várias cambindas por aí, mas hoje disse que ainda tem uma cambinda em Ribeirão, parece que Pesqueira também. Mas aí acabou. Por coincidência, a gente tem a Cambinda Brasileira e a Cambindinha de Araçoiaba. São Maracatu mais antigo. Então 105 anos O Cambindinha e 101 ou 102 o Cambinda Brasileira. Têm esse nome de cambinda, tem a ver com a história das cambindas,. 

JOSI MARINHO – É impossível não notar que os nomes dos maracatus estão muito ligados aos animais. Tem a cambinda, que é um peixe pequeno de água doce, mas tem o leão, o pavão… Como é a escolha desses nomes? 

04’08’’ – Olha, os presidentes acho que devem se reunir com sua diretoria, e cita alguns nomes e aí há um consenso, num determinado nome, mas sempre é mais Leão. Por muito tempo foi Leão, agora, depois de muito tempo, migrou para outros animais. Por exemplo, o mestre Salustiano não quis colocar Leão, aí colocou o Piaba. Piaba de Ouro… Piaba é um peixinho de água doce. Já tava lá em Olinda, e ele disse: “vou colocar o nome de um peixe”. O peixe que era mais conhecido entre eles era o piaba, as piabinhas. Piaba de Ouro, pronto. Mas hoje, de uns cinco a 10 anos para cá, tem alguns nomes esquisitos de Maracatu. 

JOSI MARINHO – Esquisitos? Quais nomes  o senhor considera um tanto… Diferentes? 

05’08’’ – Dragão. Dragão Devorador, dragão não sei o quê… Agora já tá tendo mais ainda. É galo de ouro…

JOSI MARINHO – Mas de alguma forma, isso contraria os princípios da cultura? 

– isso é evolução do tempo, né? Tem que ter nomes. Tem nome que a gente nem pensa que tem. Até eu que sou brincante de Maracatu, já ouvi falar alguns nomes aí que… “poxa, eu não sabia que tinha esse nome, não”. Então ele já saíram daqueles nomes de leão, pássaro, etc. Tem as estrelas. Estrela de Ouro, Estrela Dourada, Estrela de Prata e assim tem uma série de nomes, mas no passado ele era mais leão. 

JOSI MARINHO – Estrela… Já surge aí um nome diferente e que não vem de animais. Maracatu de Baque Solto Estrela de Ouro de Aliança. Ouro… Um minério precioso, brilhante, cobiçado. 

06’12’’ – Quando meu pai foi fundar esse Maracatu, ele já conhecia alguns Maracatus. Inclusive do Recife. Esses nomes vieram do Recife. Era Estrela da tarde, no bairro de Casa Amarela. Ele comprou estandarte e não ia colocar a estrela da tarde. Aí ele pensou ‘Estrela de Ouro’, é uma estrela que brilha muito, e valiosa, Estrela de Ouro.

TRILHA

JOSI MARINHO – Nós abrimos nosso podcast falando sobre legado, sobre a cultura passar de pai para filho. Mestre Batista, seu pai. Sem dúvidas um figura que fez muito e se doou pela cultura popular. Agora sim a gente entra na história desse grande mestre. No cenário da zona da mata, quem foi o Severino Lourenço da Silva? 

 06’59’’ –  Mestre Batista foi um grande líder. É um ícone da cultura popular, sem querer tirar o mérito de muitos outros. Mas foi um grande líder. Ele era uma pessoa muito extrovertida, de posição, de firmeza no que falava e também bastante simpático com as pessoas. Ele desenvolveu várias áreas. Ele era um grande empreendedor. Ele não vivia só de uma atividade, ele tinha várias atividades. A gente tinha aqui um fabrico de esteira de cangalha. Cangalha é que bota nas costas do burro para transportar as câmeras, antigamente. Hoje só algumas pessoas que ainda tem um burro, um jumentinho, um jerico, que chama jerico, né? E os engenhos acabaram, porque agora tudo é máquina, é enchedeira. Então a gente tinha isso. Ele era um pequeno lavrador. Ele comprava cana, vendia e plantava também. Ele era administrador de engenho, desse Engenho Jaguaribe aqui. Depois ele também foi empreiteiro, para contratar pessoas para cortar cana. Houve já uma mudança também, as usinas começaram a adotar esse tipo de trabalho, de contratar esse trabalho, essa mão de obra de fora. Não eram pessoas contratadas da Usina. Chamava-se empreiteiros. Então, ele também trabalhou com empreiteiro e depois terminou sendo contratado pela Usina para ser fiscal. A usina aliança tinha várias regiões e parece que eram uns cinco fiscais. Ele foi ser um desses fiscais, que atendiam os fornecedores particulares e também uma parte dos Engenhos da usina. E também era mestre de cavalo marinho, brincava cavalo marinho. Foi juiz de menor, disse que tinha antigamente, e comissário de polícia. Ele era tão autêntico e tão querido que de quinta-feira para sexta, o delegado da cidade era ele.

JOSI MARINHO – Parece que seus olhos brilham mais ao lembrar as histórias do Mestre Batista. 

09’30’’ – Eu sinto um grande orgulho de ter tido um pai que tenha tanto prestígio e era tão querido com todo o ambiente da cidade. Em todo lugar que ele chegava para conversar, a conversa dele era tão encantadora que a pessoa conversava uma vez e ficava sempre conversando com ele. 

JOSI MARINHO – Vamos voltar mais uma casa? A ideia é entender de onde veio o dom para cultura. Quem eram os pais do Mestre Batista e como ele se inseriu nesse ambiente cultural? 

09’58’’ – Isso é uma coisa que a pessoa já nasce, nato, uma habilidade para várias coisas. Ele era filho de mãe solteira. O pai dele deixou a mãe, teve a concepção dele e deixou. Mas essa parte cultural, essa herança cultural, a veia cultural, veio da parte da materna. O meu avô faleceu em Goiana. Ele tinha um bar em Goiana, a cidade da Fiat. Naquela rua principal, onde começa a feira, ele tinha um bar e morava lá. Eu até ia ser criado com ele, mas meu pai não deixou porque não gostava da madrasta. Aí talvez eu não tivesse aqui, né?

JOSI MARINHO – Então, nesse caso, foi sua avó quem conduziu seu pai para cultura? 

11’02’’ –  Foi, a veia artística estava na minha avó. É da família, porque essa história do maracatu e cavalo marinho, veio da família Batista, da família dela. Ela foi a condutora e ele foi o herdeiro dessa veia artística. Então, a nossa família já os nossos ancestrais, eles já tinham um Maracatu desde o ano de 1882, tem na história. Meu pai ainda deu entrevista pra Rádio Jornal do Commércio e tal sobre essa história. Em 1882, a história da nossa família vem do maracatu e do cavalo marinho desde essa época. Houve um intervalo, um meio tempo, com o falecimento de alguns dos nossos ancestrais. Com o tempo, quando meu pai nasceu, começou com oito anos, os tios brincavam o cavalo marinho e maracatu também. Mas minha avó não deixava ele brincar o Maracatu, porque antigamente os maracatus, tinham muita briga. Ela deixava ele brincar com oito anos, já brincava cavalo marinho com o tio, aí ela deixava. Ele respeitou essa história do maracatu até ela falecer. Ela faleceu em 64, aí não tinha Estrela de Ouro, mas tinha o cavalo marinho, desde 1950 que tinha cavalo marinho. Quando ela faleceu em 64… em 65, como eu falei, meu avô adoeceu, a gente morava em Vicência e veio para cá. Nessa doença que ele teve, faleceu, aí a gente ficou de vez aqui. 

JOSI MARINHO – Antes de chegar em Chã de Camarás, a família morava no município de Vicência, perto da serra do Engenho Jundiá,  em um lugar chamado Sossego Segundo.  Com o falecimento do Mestre Batista, os filhos continuaram em Aliança  mas quem são eles?   

13’18’’ – São quatro irmãos: José Paulo Lourenço da Silva, Manoel José Lourenço da Silva, José Lourenço da Silva e Severina Lopes Pereira. 

JOSI MARINHO – Todos foram influenciados pela cultura?

13’29’’ – não, nenhum. Só Zé Paulo, o Caçula brincava, mas ele não tinha habilidade para gerenciar, para conduzir o grupo. Era só brincante e faleceu com 52 anos, aqui ainda. 

TRILHA CAVALO MARINHO 

JOSI MARINHO – na bela história da Família Batista quem chegou primeiro foi o cavalo marinho. Como foi essa chegada?  Como foi o encontro dessas artes,  o cavalo marinho e o maracatu?  

13’58’’ – olha, o cavalo marinho ele já foi de pequeno, de criança. O cavalo marinho é um teatro de rua que conta uma história que tem relação com os engenhos, com a vida cotidiana dos brincantes. Essa brincadeira era exibida por oito horas. Sempre a noite, esse espetáculo e são 76 personagens em oito etapas. 

TRILHA CAVALO MARINHO 

JOSI MARINHO – Como é uma apresentação do cavalo marinho?  

15’04’’ –  É na rua. Hoje até nos palcos. Vai ter um Palco, vai ter a atração de grande e às vezes eles colocam a cultura popular antes, na abertura, num primeiro horário para dar uma oportunidade para que possa se apresentar também nas grades. Hoje, por exemplo, no Sítio da Trindade tem cavalo marinho. Nas festas, geralmente, tem um lugar na rua. 

E o cavalo marinho ele começa com o banco. Tem um banco com 5 músicas. Eles começam a entoar as toadas e vem as figuras. A toada é a música, como um cantor tem a música, e o banco entoa aquela toada com a rabeca, mineiro, ganzá, duas bases e pandeiro. Esse é o banco do cavalo marinho e aí começa a tocar. É lógico que não vai dar para você apresentar 76 personagens numa noite. Lógico que tem uma um síntese, de uma série de personagem que vão ser apresentados. 

JOSI MARINHO – E dentro desse contexto,  desses personagens,  quem era seu pai e o que ele fazia? 

17’34’’ – MEu pai ele fazia tudo. Só não fazia tocar rabeca, mas afinava. As figuras, as loas, criar… ensinar. Ele também não botava só todas as figuras, tem que ter os pares. Ele botavam certas figuras, mas tinha que ter um conhecimento geral. 

JOSI MARINHO – Como funciona essa coisa de 76 figuras? Vocês levam 76 pessoas para as apresentações ou elas se revezam?

18’07’’ –  não, não. Isso é um conteúdo de personagem que pode se apresentar.  Dentro dessa quantidade de personagens apenas uma parte que vai, porque não há como você colocar tantos personagens assim. Você tem o conteúdo na história e você “eu quero tal personagem”, aí vai lá e busca aquele personagem e representa na roda.

JOSI MARINHO – E na vida da sua família, como foi que o maracatu encontrou o cavalo marinho? 

18’45’’ – é algumas brincadeiras elas já têm uma sincronia. Ele tem um intercâmbio. É tanto que dizem que o cavalo marinho, o Maracatu têm um pouquinho de várias brincadeiras… tem do cavalo marinho… do caboclinho… Até de outras brincadeiras, então é um misto de uma série de brincadeira… o maracatu tem disso. Você tem um brincante que gosta do Maracatu e termina gostando do cavalo marinho também, brinca nos dois. Ele tem talento para isso, ele brinca nos dois. O cavalo marinho ele exige mais uma capacidade de atuação. Não é que o Maracatu seja tão fácil assim, mas o cavalo marinho ele exige mais dedicação e aptidão, um desenvolvimento tático da pessoa. Não é todo mundo que dá para brincar a cavalo marinho. 

JOSI MARINHO – Enquanto era viva, sua avó não permitia seu pai brincar o maracatu. Ele respeitou isso até o último momento. Quando o Mestre Batista disse “agora vou criar um maracatu”?

19’52’’ – é eu acho que ele já tinha isso na mente. Inclusive tinham brincantes cavalo marinho, que foram cofundador com ele, do Maracatu, porque já influenciou e já gostavam também. Ele apenas não brincava, como eu falei, porque a mãe pediu que ele não brincasse o Maracatu. Mas como ela faleceu, um ano depois ele fundou. A gente veio em 65 aqui, em 64 ela apareceu, em 65 setembro, a gente chegou aqui, e 66 fundou Estrela de Ouro. Em janeiro de 66. 

Eu tinha perto de 11 anos.

JOSI MARINHO – Imagino que foi um momento de muita emoção e dúvida também. Digamos que foi delicado,  já que a mãe do mestre Batista não queria ele brincando o maracatu. Por outro lado vem a veia cultural que pulsava. 

20’36’’ – nessa época os maracatus, eles eram poucos. Não eram tantos quanto hoje. Eles brincavam muito na circunvizinhança, porque andavam a pé. Saia daqui ia pro esconso,. Acho que o Maracatu não ia para Nazaré. Eu acho que não ia, nessa época que andava de pé. Até podia ir, porque dá para chegar, acho que menos de meio-dia chega em Nazaré. Sai por aqui por dentro. Então o Maracatu andava a pé, mas tinha tanto engenho, era uma população rural tão grande na época, que em pouco tempo ele brincava à vontade sem precisar de ir para um lugar tão distante para se apresentar. As cidades mesmo, por exemplo. Então o Maracatu, ele saiu pequeno, porque no primeiro ano, tudo no começo é um pouco mais acanhado. Então ele saiu, eu acho que no máximo 30 e poucas pessoas, talvez, por aí. No ano seguinte já aumentou mais… E aí foi. E o tempo também foi ditando as mudanças. Depois de muito tempo começou a ir para cidade, começou a andar nos caminhões. Subiram no caminhão, botavam tudo lá no caminhão e já iam para cidade. Já podiam andar para mais distante e tal. Até que chegou em Recife já em caminhões. Depois, já com o desenvolvimento a mais, começou a exigência da rodoviária, das polícias rodoviária, do trânsito…O acidente né? Que no caminhão mulheres, crianças…proibiram de andar em caminhão e passou para ônibus, mas isso já foi perto de 2000 para cá.

JOSI MARINHO – mestre Batista participou de um momento importante para a história do maracatu rural da zona da mata. Ele viu os grupos do interior se apresentando no carnaval do Recife. Um feito histórico para a época. 

22’38’’ – Em 85. O mestre Salustiano era um grande parceiro de Batista. Inclusive morou aqui também, no sítio. Era daqui de Aliança também. Ele foi para Recife, foi para Olinda, e conseguiu se estabelecer lá em Olinda e também chegar até a universidade. Com algumas pessoas da cultura, que teve o conhecimento com ele, começou a conversar e aí veio falar com meu pai, que era uma parceria. “Batista, organiza os maracatus aí”,  porque tinha que ter CNPJ, etc e tal. “Organiza os maracatus para ir se apresentar e participar do carnaval de Recife.” Recife tinha alguns maracatus, devia ter, sei lá, cinco ou mais, por aí. Tinha uns dois ou três que a gente conhecia: o Estrela da Tarde, uns maracatus que hoje não existem. Então só se apresentava ele. Tinha o Cruzeiro do Forte… Começou aí, a história do Maracatu ir para o Recife. 

TRILHA

JOSI MARINHO – O maracatu de baque solto hoje encanta os olhos daqueles que param e contemplam a cultura. A brincadeira popular atrai turistas do mundo inteiro. Os grupos, as baianas, o caboclo, o colorido, os personagens…. São tantos elementos. É uma riqueza. Mas a coisa não é fácil. Mestre, vamos continuar nessa nossa volta ao tempo. Quais as dificuldades no início do Maracatu Estrela de Ouro? 

26’18’’ – As dificuldades naquele momento era o tamanho. Até porque era dificuldade de elementos, de enfeites. Era tudo diferente, não era tão belo como é. O maracatu tinha o chapéu que era de papel crepom. O chapéu era bem pequeno, tinha umas flores na frente e tal. Não era tão grande como esses de hoje. Era um chapéu bem diferente. Foi evoluindo e veio o celofane, aquele mais brilhoso. Os enfeites também, tinha uma época que eram Jofre, eram bem diferentes. Esse problema de miçanga, nos primórdios era mais vidrilho. A golas eram de vidrilhos. Aí foi surgindo a miçanga, a lantejoula, etc e tal… e foi se moldando, foi dando condições do pessoal desenvolver essa lindeza de hoje, as golas que são muito bonitas e chamam muita atenção. 

JOSI MARINHO – fico aqui imaginando uma apresentação dessa em dia chuvoso. Um risco,  não? 

27’41’’ – Também, continua sendo… mas era muito mais. Papel é… mesmo com a tecnologia sofisticada, mas ainda se chover você tem que tirar o chapéu.

TRILHA EMOCIONANTE

JOSI MARINHO – Legado… Essa palavra vez ou outra aparece por aqui. Nesse episódio ela tá bem presente. Parece ser natural dar continuidade a um trabalho admirável. Com José Lourenço foi diferente. Claro que tinha a admiração pelo que o pai fazia. Mas depois da morte de mestre Batista, os filhos não quiseram colocar a mão na massa e o maracatu ficou nas mãos de outras pessoas. 

28’11’’ – A cultura me perdoe, mas eu corri da Cultura. É o seguinte, eu nasci na Cultura. Eu vi as dificuldades, as reclamações do meu pai. A minha irmã não gostava e achava que meu pai gastava muito, gastava o dinheiro que ele conseguia, que podia investir em outra coisa que rendesse alguma coisa pra família e ele colocava no Maracatu. Ela andou brigando com ele e eu vi tudo isso, mas eu já não discutia isso com ele. Eu só observava. Mas depois de um certo tempo eu vi assim: eu acho que a cultura, para você seguir na cultura, você só deve seguir de fato mesmo quando você tiver aposentado, porque você já tem sua independência financeira já conquistada. Porque a cultura é isso. Ela no passado não era uma fonte que você podia sobreviver dela. Mesmo assim, ainda hoje, ainda permanece que você tem que se doar para a cultura, para poder acontecer. Mesmo com todas as facilidades que hoje tem, que é o financiamento, o fomento, etc. Na época do meu pai, ele quem era o mantenedor. Ele gostava muito, como ele disse que a cultura corria como o sangue na veia dele. A minha mãe falava, mas ele dizia: “Olha, eu não bebo, não jogo, não sei quê, mas a minha brincadeira, o que eu gosto é cultura”. Então ninguém parava ele não, na cultura não. 

TRILHA

– Eu deixei de brincar o cavalo marinho quando eu comecei a estudar em Aliança. Até 16 anos eu brinquei o cavalo marinho. Eu comecei brincando… fui Galante. 

De Galante podia prosperar mais, mas quando comecei a estudar já fui me afastando um pouco. Aí veio o Maracatu, já tava com Maracatu. No Maracatu só fazia acompanhar, andar um pouco com ele e tal. Então, acho que ele percebeu. Eu quis eu quis sair, quis servir a marinha. Ele percebeu, apesar de ser aquela criação rígida daquele tempo. Dizer: “não, meu filho. Você venha para brincadeira”. Ele nunca falou isso não. Aí eu fui embora, fui para marinha, de todo jeito fui para marinha e não quis mais voltar para casa na Marinha. 

JOSI MARINHO – Na marinha, José Lourenço foi reservista naval. Serviu um ano, mas a coisa não andou. Se confundiu um pouco na escolha de umas provas e de em que estado servir e acabou reprovando. Decidiu então, voltar para o recife e enfrentar a vida por conta própria. A vida tinha outros planos para ele. O pai observava de longe a evolução, o crescimento e a independência do filho. Nunca falou nada. Deu asas a esse voo. 

32’47’’ – Eu vinha visitar meu pai, só. Depois eu vinha de três em três meses, quatro, cinco, seis meses. Eu vinha aqui e meu pai sozinho. Meu pai depois comprou um carro pequeno, foi comprar um caminhão. Eu acho que talvez ele tinha um pensamento “talvez ele venha para dirigir o caminhão.” Mas não teve jeito. No caminhão, eu nem peguei no caminhão. Pronto, eu continuei em Recife. Comecei a trabalhar, trabalhar, trabalhar e visitando. A cultura foi se desenvolvendo com as políticas, aí eu vim trabalhar nos projetos. E fiquei trabalhando com os projetos e dando continuidade no Maracatu. Sim, eu assumi o Maracatu porque os brincantes que ficaram com Maracatu vieram aqui pedir. Eu tinha uma pessoa que tomava conta na minha ausência durante 15 dias. Eu vinha aqui de 15 em 15 dias. Passaram três anos, os brincantes chegaram aqui e falaram com os senhores: “cadê seu Batista? – Seu Batista não vem essa semana não. –  Eu tô vindo aqui para o Senhor falar com ele, para o maracatu voltar aqui para Chã, porque senão vai acabar. Só tem 50% do pessoal.” O cidadão começou a história de me convencer e aceitar o Maracatu aqui. 

JOSI MARINHO – A admiração pelo legado do pai falou mais alto. 

34’52’’ –  Foi uma História demorada. Passou quase 6 meses. Toda vez que eu chegava aqui o cidadão “Seu José e aí já resolveu? – Não, não quero não. Eu já sei como é que é a cultura. Eu não tenho condições de manter. Eu tenho as minhas outras coisas para fazer. – Mas seu Zé, pense direitinho.” Toda vez que eu vinha, tinha uma conversa. “O cavalo marinho brinca seis meses. Realmente exige sua presença mais tempo. Mas o Maracatu não. É apenas uma vez no ano. O senhor pode botar um presidente e ficar só dando uma dicazinha e olhando para ver se tá tudo bem.” Eu digo: não, mas não dá. Eu sabia que o custo, as coisas, eu tinha que estar junto conversando com o pessoal, tinha a parte financeira. Eu não me achava com a capacidade. Outra coisa, meu pai, ele tinha essa força muito mais forte do que eu, porque ele era muito latente. Eu já tinha visto que dependia muito. Eu tinha que me profissionalizar, arranjar um emprego, tinha que cuidar da minha vida. Mas aí foi muito antes.

Perto dos 6 meses, depois de tanta insistência, aí eu digo: “é, meu pai realmente ele fez uma grande história. Tem uma história muito bonita”. Já tinha umas brincantes que eram daqui de casa. Tinha o Ivo, tinha o compadre Chico, que era o compadre dele, que era a segunda pessoa que ficava pra lá e para cá com ele, e alguns diretores. Pronto, é isso, eu vou dar uma força aqui. Eu decidi e pronto. Fui atrás do camarada que tava com o Maracatu. Era Ramiro, morador aqui do Engenho. Fui na casa dele. Eu tinha até falado com Manoel Salustiano no começo, mas não deu andamento na história. Eu digo: “então eu vou lá.” Fui lá na casa dele e quando eu cheguei falei com ele. “Olha, Zé, tô vindo aqui porque o pessoal foi lá na minha casa pedir para trazer o Maracatu de volta. Disse que o Maracatu tava acabando. – Não Zé, não tá bem assim não, mas como você quer eu só vou entregar porque é você. – Tá certo. Então veja as despesas que tem. Se tiver alguma coisa aí… – Eu vou ver, porque eu tô devendo a costureira, devendo o ônibus, tô devendo não sei o quê. Mas eu quero dizer a você que o Maracatu, com a falecimento de seu pai, realmente muitos foram embora e levaram as arrumações. Seu pai deixou 44, mas hoje só tem 12. Eu não pude, porque tinha família que tinha cinco ou tinha três. Essas pessoas disseram que seu pai tinha dado para eles. – Tá bem, tá certo, veja quanto que é essa conta, que daqui a 15 dias eu volto aqui.” Aí eu fui embora. Uns 15 dias depois eu voltei e ele disse quanto que era. Eu dei o dinheiro a ele e disse: “agora você não vai ser mais diretor. Você pode ser brincante. Não tem nada contra você não, mas só pela questão do contexto, do andamento da história, você fica como brincante, fica ajudando. – Tá certo, eu vou ver e tal.” Meio sacando ele não quis ficar brincando, não.  Pronto ficou.. era Ivo, depois Luiz e a gente começou conduzindo, organizando, organizando. 

JOSI MARINHO – O maracatu rural já não estava em boas condições. Muitos instrumentos estavam sucateados. O brilho um pouco ofuscado. Foi preciso muita ajuda para reconstruir. 

Eu fiz uma rifa para ver se amenizava a entrada de dinheiro. Porque o Maracatu tava só com 12 arrumações, 12 surrões desse. É uma grade onde se coloca quatro ou cinco chocalhos, prende, cobre com essa mantazinha, que ela pode ser amarela, ou vermelho, verde… isso é o surrão. É uma das indumentárias do Caboclo de lança, que dizem que são 13. Que é lança, óculos, chapéu, meia, tem uma liga, sapatos. São treze as indumentárias do caboclo de lança. Os chocoalhos, 12 estavam na grade e seis quebrados no SACO. Quer dizer que o maracatu só tinha seis surrões. Só dava para ser esse caboclo, porque o resto você ia ter que levar para soldar, ver como é que fazia ali. Alguns não prestavam. A bandeira, o terno… terno é o bombinho, a caixa, o gonguê, a porca e o ganzá. Oito vestidos de baiana e pronto. Estandarte… Era o Maracatu. O Maracatu que tinha 44 indumentárias, não sei quantos vestidos de baiana, tinha mais de 30… tinha mais de 30 baianas, 44 caboclos… Praticamente estava acabado. Deu um trabalho. Tive que trabalhar, trabalhar, trabalhar. Isso foi em 94. Em 95 foi o primeiro ônibus que saiu.

– Um dos diretores disse: “não, Zé. Você pode botar e depois você tira. Eu sei que é difícil tirar. Agora mesmo Luiz falou que uma diretora do Maracatu do Cumbe, estão querendo que ela saia, mas ela só sai quando pagarem R$ 27.000 que ela investiu no Maracatu. Então realmente é difícil, entendeu? Você coloca, mas para tirar, você não tira. Você só tem espaço para colocar. Coloca, bota aí do seu, depois tu tira. Não, rapaz. 

JOSI MARINHO – O curioso de tudo isso é que por mais que se tenha política pública, por mais que tenha incentivo….  Para brincadeira existir ainda é preciso muito investimento. 

41’37 – muito, muito, muito investimento. A gente vê assim… um Maracatu é uma microempresa pesada. Porque ela não tem limite e outra coisa, ela não dá resultado. Você só pode botar é uma empresa diferente. Eu costumo dizer que você não vê um empresário dono de Maracatu. Por quê? Porque o empresário ele trabalha com números. Números crescentes. Se não tiver crescente ele vai falir também. Então ele tem esse cuidado muito grande de trabalhar para prosperar. No maracatu ele não vai. 

JOSI MARINHO – E pra ficar mais claro ainda, aqui vai uma pergunta um tanto cabulosa. O dinheiro não dá? São as pessoas que não sabem administrar? Ou é uma brincadeira cara mesmo? 

42’23’’ – É por que é caro. Um maracatu desse sair com 143 componentes, você pagar 143 pessoas. Valores de vários tamanhos, um menor, outro maior. Alguns custos altos, por exemplo, você vai pagar a costureira é um valor. O enfeite você tem que pagar um estilista. Você não vai pagar R$ 500 nem R$ 100. Você vai pagar R$ 2.000, R$ 1.500 a um pra dar acabamento e mostrar como você vai fazer o aquela indumentária. Porque ainda tem a costureira, o valor do dinheiro que você comprou um tecido e os enfeites. 

TRILHA

JOSI MARINHO – No maracatu, Zé Lourenço não se considera um brincante… O papel dele é gerir e garantir a brincadeira. Me diga uma coisa, o senhor encontrou prazer no que faz? 

43’30’’ – Desde o momento que eu assumi, eu criei uma responsabilidade. Em algum momento assim: “ Poxa, se eu deixar o Maracatu cair e acabar… – Zé Batista, é filho de Batista e  não conseguiu dar continuidade ao Maracatu. Deixou falir.” Então fica feio, né? Não que fosse uma coisa tão feia demais, mas uma incompetência, de alguma forma tem alguma competência. 

JOSI MARINHO – Quantos brincantes o Estrela de Ouro chegou a ter? 

45’44’’ – A gente já chegou até 210. Uma maior loucura que a gente fez na vida. 

JOSI MARINHO – Por que uma loucura? 

– É porque é muita despesa e fica muito pesado. Uma brincadeira com 210 componentes, 200 componentes, é muito grande. Você para subir nos ônibus, já são três, quatro ônibus, quatro, cinco carros. É tudo muito caro. Como no Maracatu, geralmente, você contribui para indumentária de quase todos, é muito despesa. Quando você não contribui com a indumentária, ele já chega pronta, aí você paga. Por exemplo, no mínimo, um caboclo que vem pronto, você para R$ 500 conto, dependendo da arrumação dele. Se for tão bem trabalhada, ele pode querer até mais. Tem um caboclo que é R$ 700 conto, R$ 800, 700, 600. . 200 componentes, você pagar para tudo isso, para todo mundo, é muito responsabilidade e é muito dinheiro. Hoje, acho que não teria condições. 

JOSI MARINHO – E quem são esses brincantes? 

47’08’’ – tem gente de várias cidades. Tem marcador que vai sair de Nazaré e vai buscar a gente perto de Ponta de Pedra, Gambá. Tem outro que vai buscar em Camaragibe. Geralmente ele importa brincantes de outro lugar, até porque são muitas brincadeiras. Tem cidade que termina sendo fornecedora de brincantes. Por exemplo, Condado… vai gente pra Recife, vai para Nazaré e assim por diante. O Maracatu tem gente de Recife, tem de Olinda, às vezes tem gente de Goiana. Grande parte é Condado e Aliança. Esse Maracatu já nasceu com essa história. Uma conexão AliançaCondado.

TRILHA

JOSI MARINHO – Estamos num lugar lindo e cheio de histórias. O sítio Chã de Camarás abriga esse casarão, sede do Maracatu Estrela de Ouro. Qual a importância desse imóvel na zona rural? 

01’01’’01 –  Meu avô comprou esse sítio em 1918. Logicamente, já devia ter essa casa, mas ele tinha outro sítio também e decidiu morar aqui. Ele mandou fazer uma reforma e nessa reforma, mandou colocar lá na frente um símbolo 1930. Aí ficou sendo considerada a casa a partir de 1930. Então 1930, ela vai fazer daqui a 6 ou 8 anos, 100 anos. O sítio já fez 100 anos, tem 104 anos. 

50’33’’ – é uma história bastante interessante, que são poucos brinquedos. No passado tinha mais brinquedos em área rural. Hoje são poucos. A gente tem o Cambinda Brasileira e o Estrela de Ouro aqui, deve ter mais algum outro por aí. Mas são poucos os brinquedos. O Estrela de Ouro é muito importante aqui para o município, ter esse Maracatu aqui. É uma história também situada num lugar Rural e ainda consegue permanecer no lugar a Rural. Porque há uma certa dificuldade de quem tá aqui na zona rural, para quem tá na cidade. Principalmente hoje que na zona rural houve um Êxodo e o pessoal foi tudo mais pra cidade. 

JOSI MARINHO – Além de ser esse espaço de celebração da cultura, em 2004 o Estrela de Ouro de Aliança foi reconhecido pelo Governo Federal como Ponto de Cultura. 

54’53’’ – O Ponto de Cultura surgiu em 2004. O edital no primeiro Governo Lula, contemplando quem tinha uma história na cultura popular. Podia se candidatar e eu já conhecia Afonso Oliveira. Falei com ele. Afonso Oliveira é um produtor cultural que trabalha há mais de 25 anos na cultura popular e com produção da cultura popular e trabalha com projetos. É consultor de cultura popular e uma pessoa muito habilidosa. Surgiu esse edital. Eu vi assim… “eu tô vendo aqui coisa que se encaixa com a nossa história”. Aí fui falar com ele: “- Olha Lourenço, eu já estou com um grupo aqui de Olinda para escrever. Mas o grupo tá com uma dificuldade de documentos. Eu acho que é há possibilidade da gente fazer.” Um dia depois ele ligou: “- Lourenço, trás do documento.” Mas só faltavam três dias para encerrar o projeto e nesses três dias tinham sábado e domingo. Era uma sexta-feira e na segunda-feira a gente tinha que entregar o projeto. Mas ele é uma pessoa articulada, tinha já os pares “traga o documento que a gente vai”. No outro dia, na segunda-feira às 5h, a gente entregou o projeto nos correios e fomos um dos 100 projetos habilitados. 

JOSI MARINHO – O que o ponto de cultura trouxe de oportunidade para a comunidade? 

57’44’’ – Ele trouxe a possibilidade de implantação de um Telecentro, sala de informática. E aí a gente foi criado o desenvolvimento. A gente criou a biblioteca. No orçamento do projeto veio o Telecentro, veio um estúdio e depois a gente construiu a biblioteca. A gente também criou uma escola da cidadania. A escola é uma escola que não é para ensinar a ler, propriamente dito. É uma escola que ajudava a desenvolver os alunos. Essa escola deu uma contribuição muito grande para aqueles alunos que tinham dificuldades. Depois as professoras até perguntaram o que a gente tava fazendo com os alunos, que eles estavam mais desinibidos, estava aprendendo mais rápido. 

59’20’’ –  A gente chegou a ganhar com a escola até prêmio. Foi reconhecido pela ONU. Até o Prefeito, nessa época o prefeito também aproveitou o gancho e foi para Brasília, para algum encontro com alguém das Nações Unidas. Depois eu soube que era para criar um espaço aqui em Aliança, mas não foi para frente. Mas tá em Diário Oficial, tem em revista, em jornais, essa parceria e esse reconhecimento que teve através da ONU. Até para replicar esse ensinamento, mas o prefeito não deu atenção para o reconhecimento e esse espaço que ia se criar aqui com vínculo, recebendo orientações das Nações Unidas.

JOSI MARINHO – Eu suponho que esse trabalho não para por aí. 

1’00’’42 – Dentro dessas criações todas, que foi a partir do ponto de cultura, depois começei a ter uma ideia de ter um museu. Essa história de ficar permanente. Um museu do Maraca Estrela de Ouro. No momento ele inaugurou isso aqui como Espaço Permanente de Visita do Museu do Maracatu Estrela de Ouro. 

01’02’’53’’’ – Eu me sinto feliz por ter nascido nessa localidade chamada Chã de Camará.  Eu contribuí para que ela ficasse conhecida no mundo inteiro. Contribui também com a cultura do município e também com o legado na família, nessa história do Maracatu, que como falei vem de 1882.

– E a população futura, os filhos remanescentes, vão poder ter esse meu conteúdo, esse material, para saber quem aqui teve uma família que foi dedicada à cultura do Maracatu, do cavalo marinho, da Ciranda. 

TRILHA 

JOSI MARINHO – Não tem como não voltar a falar de legado. Diante de um legado tão forte, diante dessa terra que carrega tantas histórias… O que o senhor espera para os próximos anos? 

01’05’’21’’’ – eu espero que a cultura tenha continuidade. Que as pessoas consigam sobreviver mantendo a cultura, mas que é uma briga constante. A cultura ela perdeu muito espaço, porque a cultura de massa ela domina tudo. Porque ela é uma cultura que tem muita facilidade de recurso. 

JOSI MARINHO – O senhor acha que a cultura de massa é uma ameaça a cultura popular? 

01’05’’ 53’’’ – É… Demais! Você vê que agora há pouco os forrozeiros que descendem de Luiz Gonzaga, que foi o protagonista nessa história do Forró, e agora os forrozeiros tocaram muito pouco no São João.  Tanto na Prefeitura do Recife, como no estado. A ponto deles se organizarem e pediram a um deputado para fazer uma lei, para garantir um percentual na cota de recursos para as festas, festividade. Isso já mostra que é uma dificuldade. E as vezes tem nome, nome de peso, que tem uma história, que não podia ficar parado, mas eles não botam para tocar.

Eu tava conversando com um produtor. Ele tava lá no Recife: “rapaz, a gente tem Caju e Castanha, que é daqui e vive lá em São Paulo. Mas na época de festa eles querem tocar aqui, mas tem uma dificuldade de ser contratado.” Um filho da terra, que Divulga a cultura em outro estado e até é acolhido, e tem essas dificuldades. A cultura de massa, as rádios, a televisão só tocam a música que que tem jabá. Eles pagam para tocar. Às vezes até o próprio estado tem rádio e elas não tocam música popular. Então, é preciso que haja uma grande força, um grande grito do pessoal da cultura, para que se dê uma certa atenção a cultura. Porque senão a cada dia vai ficar mais difícil. 

Com a mudança do tempo não se pode fazer Cultura como antigamente. Como eu falei, antigamente era muito povoado e o sistema era diferente. As pessoas brincavam, batiam, brincavam sem recurso. Hoje virou profissão. Tem dinheiro, mas a cultura de massa tomou a atenção. A população pede e os prefeitos atendem e querem a cultura de massa, porque tem outras facilidades. O maracatu vai brincar, o forró pé de serra… não chega nem a R$ 3mil e não tem graça. Uma banda de R$ 40, 50 mil…200, 300… quanto maior o nome de fora, mas ele quer contratar. Uma cidade com duas ou três bandas de grande portes por dia. 

(…)

O dinheiro de uma banda daquela fazia uma festa muito grande e dava uma certa atenção a cultura popular. Podia mesclar e colocar as duas culturas. Se for 30% para cultura popular e 70% para se massa… podia ser ao inverso. 

TRILHA

JOSI MARINHO Essa história, o compartilhamento de tanto conhecimento foi especial para todos nós. A gente agradece por essa conversa e deseja vida longa ao Maracatu Estrela de Ouro de Aliança. 

Obrigadoooo preciso seguir… realizar os sonhos…. 

ENCERRAMENTO

JOSI MARINHO – E a gente também agradece a você que chegou até aqui com a gente.  É assim que termina o quinto episódio da Temporada Especial do Podcast Nossa História, Nossa Memória sobre os patrimônios materiais e imateriais da zona da mata  

Nesta temporada, o projeto conta com apoio da Universidade de Pernambuco, Campus Mata Norte; do Ponto de Cultura Poço Comprido; Patrimônio Vivo e Ponto de Cultura Banda Curica; Patrimônio Vivo e Ponto de Cultura Banda Revoltosa; da Associação dos Maracatus de Baque Solto de Pernambuco, que é patrimônio vivo e ponto de cultura. São parceiros, ainda, o Ponto de Cultura Bloco Rural Caravana Andaluza; Associação dos Mamulengueiros e Artesãos de Glória do Goitá; o Museu do Mamulengo de Glória do Goitá; Banda Musical Euterpina de Timbaúba, patrimônio vivo de Pernambuco.

Lembra de passar nas nossas redes sociais @podcastnossahistoria no Instagram.

– Já no Facebook somos Podcast Nossa História, Nossa Memoria.

– Estamos em todas as plataformas de áudio com episódios novos e temporadas antigas. 

– Todo nosso material se encontra no site nossahistorianossamemoria.blog.br 

– Na equipe deste podcast João Paulo Rosa com a trilha sonora. 

– O jornalista Gedson Pontes com roteiro e montagem.

– A produtora cultural Crislaine Xavier com a audiodescrição.

– Alisson Santos com a gravação. 

– Videomaker: Julio Melo. 

– Designer: Murilo Silva.

– Web designer: Saulo Ferreira   

– Apresentação e produção da jornalista Josi Marinho. 

– No nosso canal do Youtube, nossos episódios estão traduzidos em Libras – Língua Brasileira de Sinais pela tradutora Ewelyn Xavier  

– Coordenação geral e reportagem do jornalista, documentarista e produtor cultural, Salatiel Cícero.  

A gente te espera no próximo episódio !!!! Até lá!!!